O teste feito aos 23 bancos da praça nacional, consistiu em avaliar a capacidade das instituições bancárias em resistirem a um cenário macroeconómico adverso projectado
Sete bancos, quase um terço das instituições bancárias que operam no País, não passaram nos testes de “stress” do Banco Nacional de Angola (BNA), visto que deixariam de cumprir os rácios de capital mínimos em cenários de degradação da sua carteira de crédito, de depreciação do kwanza e de desvalorização dos títulos de dívida pública, de acordo com o relatório de estabilidade financeira (REF) do II semestre do ano 2022 divulgado pelo banco central recentemente, que não nomeia os bancos.
O teste de esforço (stress test na língua inglesa) feito aos 23 bancos da praça nacional, consistiu em avaliar a capacidade das instituições bancárias em resistirem a um cenário macroeconómico adverso projectado para um período de 12 meses. Este cenário baseou-se em quatro riscos, nomeadamente, o risco de crédito, de mercado, operacional e o risco da taxa de juro da carteira bancária. Assim, para a identificação dos riscos do sistema financeiro nacional, o BNA realiza testes de “stress”, que consistem na análise do impacto, individualmente em cada banco e no agregado do sistema, de “choques” em algumas variáveis que afectam a actividade bancária, como a deterioração nos níveis de risco da carteira de crédito aos segmentos “empresas” e “particulares”, a apreciação ou depreciação do Kwanza, a perda de activos no exterior, a fuga de depósitos e os movimentos da taxa de juro da carteira bancária.
Para o risco de crédito foram criados dois choques referentes à carteira de crédito e aos títulos de dívida pública detidos até à maturidade. As variáveis macroeconómicas de maior relevância para a determinação da dimensão dos choques foram a queda do Produto Interno Bruto (PIB) e do preço do petróleo. Também foram simulados dois cenários para o risco de mercado, através de um choque ao risco cambial e um outro ao nível dos títulos de dívida da carteira de negociação. O cenário foi constituído pela depreciação do kwanza face ao dólar e flutuações na LUIBOR (a taxa que os bancos cobram quando emprestam dinheiro entre si, além de servir de referência para o crédito a clientes).
Já a dimensão do choque associado ao risco operacional foi determinada em termos relativos, como uma percentagem dos fundos próprios dos bancos, enquanto o choque sobre o risco de taxa de juro da carteira bancária foi determinado com base na variação da taxa de inflação. O curioso é que alguns cenários criados aquando da realização do teste, estão a verificar-se este ano, como é o caso da depreciação do kwanza face ao dólar, perdendo cerca de 40% do seu valor desde o início do ano, bem como a alta da inflação.
Assim, sete bancos registaram uma situação de incumprimento com o total de requisitos de capital do processo de Análise e Avaliação de Supervisão, tendo em consideração os pressupostos assumidos, e um banco encontrava-se em situação de utilização do requisito combinado de reservas.
Ainda assim, o estudo do banco central argumenta que “o sector bancário em termos agregados e grande parte das instituições estão resilientes para fazer face aos riscos a que estão ou poderão a vir a estar expostos, com o rácio de fundos próprios regulamentares a situar-se nos 17,46% no cenário base e 8,91% num cenário adverso, acima do limite mínimo regulamentar (8%)”.
Mau sinal para o sistema financeiro
Para o economista Mateus Maquiadi, o facto de sete bancos falharem no teste representa um “alto risco” para a estabilidade do sistema financeiro, já que a interdependência dos bancos é uma realidade.
“Sete banco significa pelo menos 30% da banca e implica alta vulnerabilidade. Estou inclinado a pensar que se trata de bancos pequenos, não sistémicos, mas em todo o caso é mau para a estabilidade do sistema financeiro. Como foi feito no ano passado, a essa altura o BNA já terá tomado outras medidas”, disse.
Ainda assim, para o economista, embora se tenha recomeçado a fazê-los tarde, os testes de stress são importantes para perceber até que ponto o sistema financeiro pode resistir a determinados eventos mais adversos à economia. “A realização destes testes é que nos permitiu perceber, por exemplo, como as instituições financeiras como bancos e seguradoras conseguiram mesmo em cenários mais adversos continuar a prestar serviços financeiros. Repare que em 2008 tivemos uma grave crise financeira mundial, e em Fevereiro deste ano três bancos [internacionais] caíram, a começar pelo SVB. Estava-se a falar de uma nova crise igual a 2008, mas não houve no final do dia, isto porque o sistema está agora mais protegido e robusto. O tal efeito contágio, por exemplo, não se verificou”, apontou, dando nota que a realização destes testes é crucial para implementação da política macroprudencial, sem a qual não existe estabilidade financeira.
Por sua vez, o presidente da Associação Angolana de Bancos (ABANC), Mário Nascimento, argumenta que os resultados do teste são um alerta ao BNA e aos bancos sobre a estrutura de balanço das intituições bancárias e a gestão das suas carteiras, visto que os bancos têm uma importância vital para o sistema financeiro e para economia. “Não sabendo quais foram os bancos que não passaram no teste e quais os níveis de incumprimento, não podemos e não devemos tirar conclusões alarmantes sobre o nosso sistema bancário”, defendeu.
Queda do kwanza pode levar a aumentos de capital
A recente depreciação do kwanza acentuou as perdas em alguns bancos que têm grandes posições cambiais líquidas negativas, o que exigirá a atenção do BNA, em particular se for necessário um aumento de capital, alertou o Fundo Monetário Internacional (FMI) no mais recente relatório sobre as primeiras discussões de avaliação pós-financiamento com Angola (PFA), divulgado na semana passada.