O actor brasileiro Armando Bógus deu corpo e vida a Zé das Medalhas na novela Roque Santeiro, exibida pela TPA em 1986. Era dono de uma ourivesaria em Asa Branca.Fabricava medalhas religiosas. Vendia sobretudo imagens de santos. Em especial de Roque, o “santo milagreiro” que dava nome à novela.
Angola tem o seu próprio Zé das Medalhas. Quarenta anos depois. Chama-se João Lourenço. Só que veste fato e gravata presidencial. Distribui medalhas e diplomas a torto e a direito. Entre uma e outra das constantes viagens ao estrangeiro, homenageia cidadãos que prestaram serviços relevantes à Pátria ao longo da existência do Estado angolano. A liturgia começou a 04 de Abril. Só vai terminar a 11 de Novembro do presente ano.
Os ministros assistem. Aplaudem sentados. Segue a cronometria da paralisia do País.
Durante 180 dias, 25 semanas e 5 dias (4 320 horas, 259 200 minutos, 15 552 000 segundos) a máquina do Estado funciona a meio gás. E ainda faltam 41 dias, 5 semanas e 6 dias – 984 horas, 59 040 minutos, 3 542 400 segundos de palmas e assentos aquecidos. É o teatro das medalhas de João Lourenço.
Já perdeu a graça. Brilho. Prestígio. Solenidade. É ritual de poder. Disciplina partidária. O Executivo vive para a cerimónia. Não vive para o País. Muito menos para os cidadãos. Trabalha para os holofotes. Não para o cidadão-eleitor.
Cada vez que há uma condecoração, o Governo pára. E quando o Governo pára, pára Angola. A vida do País fica em “ralentin”. Um motor engasgado mantém a Nação no atraso. Enquanto João Lourenço colecciona medalhas e aplausos, o País colecciona atrasos. Problemas e abandono.
Enquanto os ministros batem palmas e aquecem assentos, o País continua à espera. Estradas esburacadas. Hospitais sem medicamentos. Escolas a cair aos pedaços. Insegurança pública. O Executivo vive para o palco. Não para a vida real. Distribui medalhas e diplomas. Mas deixa o cidadão-eleitor pagar com atraso. Frustração e abandono.
Os quase quarenta anos de guerra transformaram o País num estado paleolítico. Não devia desperdiçar mais tempo em encenações protocolares. Cada hora de ministros sentados a aplaudir é uma hora sem estradas. Uma hora sem hospitais. Uma hora sem escolas. Uma hora de insegurança pública. E esse é um luxo que um cidadão-eleitor pobre não pode pagar.
As medalhas de Asa Branca eram bugigangas. As de Angola custam mais: Custam tempo. Futuro e dignidade. E ninguém mede o preço que o cidadão comum tem de pagar. Enquanto João Lourenço colecciona aplausos, o País colecciona problemas. O cidadão-eleitor, este, continua a conjugar o verbo esperar… no Presente do Indicativo.
Por: Jorge Eurico, Jornalista.